domingo, 17 de junho de 2007

antónio

SE EU NÃO TE AMAR MAIS

Se eu não te amar mais me
Caia o mar nos ombros
Me caia
Este silêncio pelos ossos dentro
Me cegue os olhos esta sombra
Me cerre
Esta noite num escuro mais profundo
Do que a chuva de ti de mãos tão leves
A figueira do meu sangue se emudeça
De pássaros à espera dos teus passos
De outra voz por sobre a minha
Morta
E as ruas do teu corpo eu desaprenda
Como desaprendi os dedos que me tocam
E se eu não te amar mais me caia a casa
De costa no teu peito como o vento

(António Lobo Antunes, escritor e poeta português, 26 títulos publicados, traduzidos em 16 línguas)

O autor, em uma de suas entrevistas, justificando sua antiga fama de enfant terrible da literatura portuguesa, declarou em uma entrevista: "Custa-me conceber um poeta que nunca tenha feito amor. E às vezes quando leio certos prosadores portugueses, não têm esperma nenhum lá dentro, são tudo coisas que se passam dentro da cabeça. Pensam muito. E a literatura faz-se com palavras. "

Conhecia sua prosa densa e perturbadora, a alternar narradores, seus períodos intermináveis - que faz com que a leitura se torne compulsiva, como o próprio texto -, seus personagens sempre à beira de um colapso.

Leio agora a poesia de Lobo Antunes e, ao descobri-la, descubro o terno António, como uma vez ele se definiu.

dor de amar

Ontem lia um poema do Vinícius que fala sobre a dor de amar. Ele termina assim:

"Tanto tempo faz
tens um outro amor, eu sei

mas nunca terás
a dor a mais
como eu te dei
porque a dor a mais
só na paixão
com que eu te amei."


Nunca pensei que fosse me acostumar a conviver com essa dor.
Às vezes me distraio e ela me abandona. Parece que me falta algo, vou ver: é ela. Trato logo de resgatá-la, para que eu sinta meu coração bater novamente.

(30/11/05)


[relendo e-mails antigos, só pra sentir meu coração bater novamente]